Desde o início das negociações que culminaram na assinatura do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) e o Termo de Ajustamento de Conduta relativo à Governança (TAC-GOV) relativo ao rompimento da Barragem do Fundão, a preocupação com a reparação aos danos e prejuízos às pessoas direta e indiretamente envolvidas na tragédia de Mariana (MG) esteve no centro das discussões. Dos R$ 100 bilhões em dinheiro novo previstos no acordo, que deverão ser pagos ao Poder Público, R$ 40,73 bilhões serão destinados diretamente aos atingidos.
"Esse é um acordo histórico, que permitirá compensar não apenas as pessoas afetadas diretamente pela tragédia de Mariana, que são o foco principal das nossas atenções, mas reparar os danos causados ao meio ambiente, e que também prevê apoio aos municípios e estados envolvidos", frisa o ministro Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral da Presidência da República.
“Tratamos de olhar em primeiro lugar para as pessoas, em segundo lugar para o meio ambiente e em terceiro lugar para um programa de retomada econômica na região”
JORGE MESSIAS
Advogado-geral da União
A barragem do Fundão era de responsabilidade da Samarco, empresa controlada pelas mineradoras Vale (brasileira) e BHP Billiton (anglo-australiana). O processo que culminou no acordo assinado nesta sexta-feira (25/10) começou a ser trabalhado pelo Governo Federal ainda na transição, em 2022, e foi marcado por dois anos de intensas negociações coordenadas pela Advocacia-Geral da União (AGU).
O acordo coloca em movimento um ciclo de compensação mais abrangente e eficaz para as vítimas, assim como estrutura, de forma mais sólida, quais reparações serão efetivadas por meio de políticas públicas.
"Tratamos de olhar em primeiro lugar para as pessoas, em segundo lugar para o meio ambiente e em terceiro lugar para um programa de retomada econômica na região", ressalta Jorge Messias, advogado-geral da União.
INDENIZAÇÕES E REASSENTAMENTO – Pelos termos acordados, as empresas responsáveis pelo desastre se mantêm obrigadas, além do pagamento de indenizações, a avançar e finalizar o reassentamento de famílias nas localidades de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, com a construção de moradias dignas e adequadas às necessidades locais. As áreas para a reconstrução foram escolhidas por meio de votação dos próprios moradores. Coube à Fundação Renova adquirir os terrenos. De acordo com a organização, 189 famílias devem ser reassentadas em Bento Rodrigues. Em Paracatu, são 72 famílias.
O número de pessoas impactadas, contudo, é muito maior. Além daqueles que perderam suas casas, milhares foram afetados em suas atividades produtivas — impedidos de pescar ou plantar em decorrência da contaminação dos rios. Nesta condição, até mesmo a comprovação documental dos danos sofridos é precária. A nova pactuação permite a implantação do Programa Indenizatório Definitivo (PID) para todos aqueles que não tenham sido beneficiados em programas indenizatórios anteriores.
O PID pretende alcançar os atingidos pela tragédia que não conseguiram comprovar documentalmente os danos sofridos. Essas pessoas receberão o pagamento de R$ 35 mil aos atingidos em geral, e R$ 95 mil aos pescadores e agricultores afetados. A estimativa é de que mais de 300 mil pessoas terão direito a receber esses valores. Para cumprir com essas obrigações, as empresas estimam gastar R$ 32 bilhões.
TRANSFERÊNCIA DE RENDA – Sob responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), o Programa de Transferência de Renda (PTR) prevê R$ 3,754 bilhões para um auxílio mensal a pescadores e agricultores atingidos no valor de 1,5 salários-mínimos por até quatro anos, com pagamento realizado com cartão do Governo Federal (Caixa Econômica Federal).
RETOMADA ECONÔMICA – Outros R$ 6,5 bilhões serão destinados a investimentos em Programas de Retomada Econômica (PRE), que está amparado em três eixos. O primeiro é o fomento produtivo, destinado à promoção de negócios geradores de emprego e renda de responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Há também o Eixo Rural, coordenado pelo MDA e pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), voltado a impulsionar atividades produtivas e sustentáveis de agricultores famílias, produtores rurais, assentados da reforma agrária, quilombolas, e povos e comunidades tradicionais, entre outros. Por fim, o Eixo Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação é destinado ao fomento de ações nestas áreas.
FUNDO POPULAR – No Eixo Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação ainda estão previstos R$ 5 bilhões para serem aplicados no Fundo Popular da Bacia do Rio Doce, para investimentos em projetos e programas de retomada econômica e produtiva por deliberação direta das comunidades atingidas, em áreas que elas consideram prioritárias, atrelado ao Conselho Federal de Participação Social. Tanto o Fundo quando o Conselho foram construídos em uma articulação da Secretaria Geral com a sociedade civil. O Fundo prevê ainda o ressarcimento à União por gastos extraordinários com Previdência Social, ações acidentárias e manutenção da condição de segurado especial dos pescadores que ficaram impedidos de exercer suas atividades; e para a manutenção da Assessoria Técnica Independente por 30 meses após a assinatura do acordo.
MULHERES E POVOS TRADICIONAIS – Um total de R$ 8 bilhões estão destinados à realização de um modelo de autogestão dos próprios Indígenas, Povos e Comunidades Tradicionais, acompanhados pela União. Esses recursos devem, entre outros, assegurar o direito ao recebimento de auxílio financeiro e verbas reparatórias, bem como a implementação de políticas públicas pelo Governo Federal a outros povos e comunidades não reconhecidos. Já sob a responsabilidade do Ministério das Mulheres, Ministério Públicos e Defensorias, estão previstos R$ 1 bilhão para o pagamento de auxílio financeiro às mulheres vítimas de discriminação de gênero durante o processo reparatório.
PESCA – Estão previstos no acordo R$ 2,44 bilhões para viabilizar a liberação gradual da pesca na região atingida pela tragédia, hoje suspensa por decisão judicial. O Plano de Reestruturação da Gestão da Pesca e Aquicultura (Propesca) trabalhará em ações desenvolvidas pela União e pelos estados com o objetivo de promover a reestruturação das cadeias produtivas de pesca e aquicultura afetadas.